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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

"Professores Como Intelectuais Transformadores"

Oi gente! Hoje escrevi um post bastante diferente do que costuma aparecer por aqui. Se tiverem paciência, divirtam-se:


Candau aborda a didática como sendo um processo de ensino-aprendizagem em que o professor não é um transmissor de conhecimento apenas. Ela se refere a esse processo como a união da dimensão humana, técnica e político-social. Tendo isso em vista, sabemos então que a didática não é algo neutro em que a afirmação técnica silencia a política, mas sim uma via de desenvolvimento crítico do educando para que o mesmo possa se pensar dentro das realidades existentes: a sua e as outras. Dessa forma, refletir sobre a didática pressupõe compromisso com a transformação social. Com essa afirmação descarto a visão de uma escola tecnicista, redentora e reprodutora. Candau dialoga com Luckesi, quando este expõe que a educação transformadora é tida como uma crítica, uma educação que não padroniza, mas que atende a sua coletividade. Uma educação transformadora seria, portanto, uma visão não oposta à otimista – de uma educação de redenção, com a escola sendo uma entidade extrassocial e fornecedora de cura das mazelas sociais através de uma busca pelo padrão ideal – e nem à pessimista – escola reprodutora, que perpetua a situação de classes vigentes –. É uma metodologia que vai contra as necessidades não atendidas pelos caminhos já propostos (ou pode-se pensar que, sim, as visões, pessimista e otimista, atendiam a outras necessidades de outros interessados que a educação transformadora se opõe).

Em uma pesquisa realizada com alunos do Ensino Médio, estruturada nas características de uma abordagem metodológica qualitativa, de uma escola pública no litoral do Estado de São Paulo (disponível em www.anped.org.br/reunioes/31ra/1trabalho/GT04-4632--Int.pdf) constatou-se que “ser competente não significa apenas dominar os conceitos de sua disciplina, ser criativo e comprometido, é necessário que reflita criticamente sobre o valor do que, para que, por que e para quem ensina, visando à inserção criativa na sociedade, a construção do bem-estar coletivo e direcionar sua ação para uma vida digna e solidária” (RIOS, 2002).

Assimilados os pressupostos de o professor não ser uma entidade acima do aluno, puro transmissor de conhecimento, dono do poder de decisão sobre a aprovação, ou reprovação, da absorção por parte do aluno das técnicas que lhe foram impostas, convido a leitura de um post (http://my.opera.com/rockarlos64/blog/show.dml/25980761) do blog de um indivíduo que foi meu professor de literatura na 6ª e 7ª séries para que possamos refletir os conceitos já expostos e agregar mais alguns à nossa discussão.

Geralmente alguns orientadores me pedem uma visão positivista para a elaboração de algum estudo e assim me distancio do objeto de estudo, porém como a discussão da didática necessita de uma aproximação para que o trabalho se reconheça como viável e prático, será impossível eu não usar a primeira pessoa e ignorar experiências escolares próprias para realizar minhas argumentações. Assim, começo refletindo sobre o tempo que passávamos em frente à turma enquanto a professora nos “tomava tabuada” e/ou “tomava leitura”. Quando errávamos alguns riam, outros ainda mentalizavam aflitos as possíveis perguntas matemáticas que viriam, ou as palavras mais difíceis do texto que apareceriam na nossa vez. O constrangimento da exposição dos nossos erros para todos da turma era traumatizante. O professor que fazia isso acreditava que esse trauma faria com que os alunos “aprendessem mais” e assim, cumpririam a proposta de passar para os seus alunos todos os conceitos de um programa desenvolvido pelo professor, ou pela instituição de ensino, ou pelo governo, dentro do prazo estabelecido (mês, bimestre, período ou ano). Pois bem, decorávamos a tabuada, as palavras complicadas, a diferença entre “a gente” e “agente”, os afluentes do Rio Amazonas. Fazíamos isso movidos pelo medo de passarmos, mais uma vez, pelo constrangimento frente à turma. Hoje essa exposição se dá de outras formas. Recebemos por e-mail as “pérolas do ENEM” ou esbarramos com o blog de um antigo professor debochando dos seus alunos. No caso específico do blog que citei, em determinado momento o professor responde a um comentário da seguinte maneira: “Tudo que está aqui foi colocado em sala de aula de forma bem humorada e anônima, e, ao contrário do que vc pensa, eles gostaram e se esforçaram para não repetir mais estes tipos de erros”. A forma “bem humorada e anônima” é bastante ambígua, já que ninguém gosta quando tem seus “erros” ou “defeitos” expostos. Segundo Paulo Freire “O erro não é pecado, mas parte ou momento do processo de aprendizagem”. Um educador não pode assumir a postura de detentor da verdade e do correto. Ele deve ser aquele que problematiza e discute os conceitos que carrega com os seus alunos. Um educando que é tratado como inferior, como se a cultura que carrega consigo fosse menor e/ou desnecessária, é desestimulado no processo de ensino-aprendizagem. Esse será um forte candidato ao desgosto e possível desistência dos estudos. A forma que um professor de literatura trata os equívocos da escrita para com os alunos do Ensino Médio é fundamental para o despertar do interesse pela língua que tem. Há um conhecimento que foi socialmente criado e estruturado (como é o caso dos “clássicos da literatura”, por exemplo), esse conhecimento deve ser compartilhado, discutido, problematizado, mas não apenas transmitido. Essa é uma das ideias que Freire introduz para o campo de ensino-aprendizagem para que se estimule os educandos e, assim, tenham-se no caso desse professor, alunos com “menos erros ortográficos”.

Desenvolver linguagem crítica que atenda aos problemas da experiência cotidiana, discussões, envolvimento dos alunos para com as aulas (e como essas são guiadas) de acordo com os conteúdos expostos e trabalhados, são aspectos que tornariam o fazer pedagógico mais político, guiando a escolarização para sua inserção numa esfera mais ampla do que as paredes de uma sala de aula proporcionam. As escolas servem para introduzir e legitimar formas particulares de vida social. Em resumo: escolas não são lugares neutros e professores tampouco podem assumir essa postura, dessa forma inibindo e ridicularizando seus alunos por “deterem mais saberes”.

10 comentários:

  1. Tô bobo. Não é que ele também sabe falar sério!!!!
    Pois é Bruno, toda sua argumentação teórica é válida e fundamental para a formação daquele que quer realmente ser professor. Nos meus 30 anos de experiência, constatei que é na sala de aula que você vai descobrir que didática usar. Os princípios são os mesmos mas a atuação tem que ser diferente, pois cada sala é um universo a parte. A pedagogia libertadora, aquela que forma cidadãos conscientes, deve nortear todo o trabalho, com o compromisso com a bagagem cultural do aluno.
    Não vou estender muito para não lhe cansar.
    Bjão

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  2. Exatamente, Wanderley! Não entrei no mérito da prática porque se não iria virar um texto maior do que já está [e para um blog isso não é muito legal rs], fora que enxuguei muito a parte teórica.
    O texto é mais uma lembrança ao referido professor rs

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  3. Este comentário foi removido pelo autor.

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  4. Vc sempre nos surpreendendo. Conhecemos bem pouco você. hehe!

    E podexá que da próxima vez eu vou falar com você. E vou ficar feliz se eu souber que vou estar te salvando de alguma coisa ou de alguém. hehehehe!

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  5. Oh god! Monografia comes on my mind!

    Usei argumentos muito parecidos, mas a diferença é que usei o Chevallard e o conceito de transposição didática. Dá uma lida, complementa bastante esse gap da escola como um espaço neutro, e a transforma em uma geradora de conhecimento próprio.

    E o 996 tava tão, mas tão longe... nem ia rolar andar até a gávea para pegá-lo ahauahauahu

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  6. Gosto do que leio. Essa quebra entre o papel -ahn, diga-se "clássico", por falta de termo melhor - do educador e essa nova função, nas novas mídias, nas redes sociais, é ainda muito confuso. Não acho que se tenha diminuído; mas acho que o professor hoje é mais "acessível". E aí, o que era da esfera pessoal - a graça pelo désdem, que, convenhamos, não surgiu neste século - atinge a esfera pública de maneira avassaladora e, pasmo, pueril, tão boba e infantilizada quanto os alunos que são criticados. A diferença é que, para eles, "bobo" e "infantil" são termos cabíveis e desprovidos de conotação pejorativa; no nosso caso, educadores, assume tom torpe e sem-graçola.

    Esses caras não conhecem é teoria de porra nenhuma. E são, na prática, uns afetados.

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  7. Muito obrigado Bruno. Vindo de vc é muito iportante o elogio sobre o blog
    Leia lá coloquei postagem nova... a Se quizer me siga.
    Abraço...
    PS: Cada dia mais bonito...

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  8. Tá faltando isso mesmo. Por sorte, eu encontrei alguns desses professores ao longo do ensino fundamental e médio, e creio ter um grande número deles na faculdade.

    O interessante é que investe-se pouco na formação de bons professores e não se valoriza a profissão (a.k.a. salário baixo).

    Tem que ver issae...

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  9. Onde dá RT?

    Perfeito, gato.

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"frente a uma sociedade e uma linguagem reificadas, o indivíduo afirma dolorosa, agressiva ou humoristicamente sua diferença"
Theodor Adorno