Uma irritação maior

Sobre a notícia do pai que foi agredido com o filho por acharem que eram gays eu fiquei imaginando qual seria a resposta "se desculpando" a essa brutalidade que seria lançada pelos agressores ou pelos incentivadores (aqui lê-se os religiosos fundamentalistas, os neo-nazistas travestidos de bolsonaristas, os "que não tem preconceito, mas..." dentre outros).

"Poxa, eles não se mostraram héteros o suficiente e acabamos confundindo. Vocês que entenderam errado."

Os pedidos de desculpas feitos tem me irritado muito mais do que a própria ação ofensiva. A nota oficial publicada por Myrian Risos Rios me agride mais do que sua declaração comparando gays com pedófilos.

Por que? Bom, pelo simples fato de que ela, Myrian Rios, trata seu leitor/cidadão/receptor de suas mensagens/eleitor como idiota, como acéfalos! Ela joga para nós a culpa do que disse, alegando que nós entendemos de maneira errada o que ela disse com a maior clareza do mundo!

Me dá asco ler sobre um bispo alegando a jornalista Eliane Brum que o estupro acontece quando a mulher consente porque está "em defesa da vida, contra o aborto" e faz a comparação deste ato com uma tampa de caneta quando a religiosa vai à ele pedindo apoio [!!!!]:

"o bispo pega a tampa da caneta da repórter e mostra como conversava com mulheres. 'Eu falava: bota aqui', pedindo, em seguida, para a repórter encaixar o cilindro da caneta no orifício da tampa. O bispo começa a mexer a mão, evitando o encaixe. 'Entendeu, né? Tem casos assim., do: ah, não queria, não queria, mas acabei deixando'"

Mas me irrita muito mais o seu pedido de desculpas num e-mail de resposta a jornalista em que tal bispo [Dom Luiz Bergonzini] publicou em seu blog. Em um dos trechos ele diz:

"Sei como é fácil retirar uma palavra ou alguma expressão ou um trecho de um contexto escrito, ou de uma entrevista, e criar um fato polêmico com ela."

E depois fala:

"Não estamos tentando explicar nada (Estupro-e-aborto-sao-crimes-hediondos) , como a senhora diz, mas trazer os fatos para dentro do contexto da entrevista, que era a diferença entre a mulher forçada a praticar o ato sexual (estupro) e a que participa do ato sexual por vontade própria."

Ele primeiro reafirma o que disse, mas alegando que a jornalista colocou sua fala num "contexto polêmico", e depois ele diz que na verdade dizia outra coisa, uma diferença entre dois tipos de ato sexual. TANTO FAZ se ele estava ou não dizendo sobre dois tipos de ato sexual, NUNCA uma declaração comparativa dessa poderia ser sustentada!!! A incoerência sendo usada como resposta lógica por parte do bispo me agride porque fere profundamente a minha capacidade de compreensão!
De repente o bispo foi tão compreensivo com a dor das mulheres que até se esqueceu que elas "podem evitar o estupro".

E isso não tem sido uma saída exclusiva dele ou da deputada. Bolsonaro fez a mesma coisa quando disse que "se equivocou" com as respostas das perguntas feitas pelo CQC e logo em seguida manteve a postura homofóbica porque, né? Homofobia não é crime, como é o caso do racismo. "Não há contexto", "não encaixa". Todos viram o vídeo do seu comentário racista no CQC. Essa sua justificativa no plenário "encaixa"?

Não entendo como esses incitadores de ódio continuam conseguindo se esconder atrás desses pedidos de desculpas ou erratas [posso chamar assim?]. É uma irritação maior e uma constatação de uma expressão que minha avó sempre disse para me passar a ideia de ficar calado quando não temos uma resposta mais reflexiva para dar de alguma alegação ruim que tenhamos feito. É, vó, você tinha razão: "A emenda é pior que o soneto".